História

O Fourierismo e os Primórdios do Socialismo no Brasil

Autora: Adelaide Gonçalves

I – O Brasil do Século XIX
O Brasil inicia o século XIX preso ainda às amarras coloniais, uma sociedade rural e escravocrata onde são raras as cidades dignas desse nome onde uma diminuta classe média letrada, vive acomodada em sua existência pacata. As notícias da agitação na Europa deveriam parecer boatos remotos aos poucos interessados na vida do Velho Continente. Apesar disso, as mudanças aproximavam-se, a corte portuguesa estava prestes a fugir para o Rio de Janeiro, onde chegaria em 1808, escapando dos exércitos de Napoleão e do vendaval liberal. O século terminaria com um país independente que havia, finalmente, abolido a escravatura e onde as idéias liberais da Revolução Francesa e as teorias socialistas, nascidas na Europa, chegavam nos porões dos navios, através dos livros e outras publicações ou na cabeça de imigrantes que, mais que a riqueza, procuravam a utopia.

Nas primeiras décadas do século XIX, no Nordeste do Brasil, a experiência cosmopolita era diminuta e o ambiente intelectual estava marcado por uma pobreza provinciana. A desigual e descontínua circulação de idéias, alargada, pouco a pouco, a partir de 1808, encontra eco junto a um público reduzido e díspar: comerciantes das casas importadoras, estudantes de liceus, preparatorianos e dos cursos jurídicos, professores, empregados da função pública, militares, livreiros, tipógrafos, literatos, livre-pensadores, membros de irmandades secretas, padres, entre outros.

Dito de outro modo, até onde e de que modo o Iluminismo, via Ilustração Européia, alcança e se desenvolve na América Portuguesa ?

Lentamente, com variantes, mas “é o fermento iluminista que aduba 1817, 1824 e se prolonga por quase todo século XIX no Recife”, como registra Gláucio Veiga, para quem “aqueles nascidos em Pernambuco e no Nordeste, nos últimos decênios do século XVIII, climatizados no pombalismo e modelados pelos oratoreanos […] sentiram que não se tratava apenas de uma revisão, antes uma ‘revolução mental’, prenunciadora de algo misterioso, porém, renovador”. No dizer da época: era uma “premunição” de que “o Mundo está dobrando uma esquina”.

Aqui é pertinente recorrer à cautela metodológica sugerida por Wilson Martins para o estudo deste período: “chamado com enorme latitude terminológica de Iluminismo Brasileiro tenha sido um período contraditoriamente caracterizado pela repressão contra as idéias ilustradas”. Dos padres, da Congregação do Oratório, diga-se do seu papel destacado na democratização do ensino. Sua biblioteca no Recife de1826 é a melhor da época, ultrapassando os quatro mil volumes. Quanto aos professores régios, desde a secularização do ensino, impulsionaram o sentimento liberal e difundiram as idéias filosóficas combinadas à política, aquilo que Veiga acertadamente anota como “o desbordamento da ação prática, tecnológica e científica para a problemática política”. Isso se dá em 1817 e na vaga revolucionária que se segue: 1824, 1834, 1848, vaga agitada sob o influxo da Revolução Francesa. Como assinala Joaquim Nabuco: “todas as nossas revoluções foram, dir-se-ia, ondulações começadas em Paris”. Ou, como assinalaria Amaro Quintas sobre a Revolução Praieira, de novembro de 1848: “a influência das idéias revolucionárias francesas no movimento da Praia, da interferência do espírito quarante-huitarde na preparação e no desenvolvimento da nossa revolta de 48”.

Não obstante as dificuldades próprias impostas pelo projeto colonizador quanto a circulação de idéias, à formação de uma opinião pública, liberdade de expressão e condições de funcionamento livre e regular da imprensa; os motins, os movimentos de contestação, de protesto e de revolta, os grupos sediciosos são demonstrações do inconformismo, expressam elementos de coesão, vão conformando uma arcabouço ideológico de novo tipo e constróem um novo léxico político. Nalguns casos são simples levantes, pura contestação; noutros, caminham para além do protesto. É o caso de 1817, em Pernambuco. Recife passa a ser vista como o palco “da desordem e insubordinação de indivíduos turbulentos”, no dizer do reacionário Visconde Cairu, para quem fixar um curso jurídico em Pernambuco é desatino: “seria perigoso estabelecer aí Universidade, no risco de corromperem os jovens no foco do jacobinismo”. O referido curso é instalado em 1828, em Olinda.

Antonio Pedro de Figueiredo, em sua tentativa de sistematização, na revista “O Progresso”, das idéias que chegam da Europa, realiza um esforço de observação e análise das realidades específicas de seu tempo e espaço, sem que as idéias difundidas sejam mero exercício de transplante cultural ou mimetismo do pensamento em voga nos círculos mais progressistas da Europa, em particular da França. Em suas seções “Exterior” e “Páginas Informativas”, trata do avanço tecnológico e das ciências naturais como condição essencial de progresso, como bem anota Gláucio Veiga: “não descurou nem alheou uma autoconsciência”. Para Veiga, Figueiredo bem pode ser justamente apreciado como exemplo de “letrado à força do método”. Diferença fundamental em Figueiredo, pois que a vigência no Brasil do novecento é ser “letrado a força do estudo”, daí a ausência de “ortodoxias ideológicas”, o ecletismo, derivados da aquisição de conhecimentos por acumulação de autores e teorias européias, sem sentido crítico e como “esforço de colagem de instituições européias no Brasil”.

Tal anotação de Veiga é tomada da “sugestão metodológica” afirmada em Euclides da Cunha em relação ao exame das idéias no Brasil do século XIX: em que medida se dá uma tradução das realidades nacionais ou em que medida se dá tão somente uma “atualização” cujo parâmetro são as realidades européias?

Para Alfredo de Carvalho, dos primeiros a tratar do pensamento de A .P. de Figueiredo, é ele uma “mentalidade vigorosa e singularmente culta, traduzia pouco antes dos vinte anos o Curso de Filosofia de Victor Cousin”. Isto referido a um tempo, descrito pelos espíritos argutos, em que era acentuada a distância do pensamento europeu de vanguarda. Senão vejamos a impressão de Lopes Gama: “cada século tem uma doutrina dominante, a qual comunica a sua influência a uma parte das opiniões e das ações dos homens. O nosso Brasil desgraçadamente caminha um século atrasado da civilização européia; e pode-se dizer que ainda se acha no século XVIII”. Ou ainda: “Nós somos nesta parte ainda os Franceses do século passado…”.

II – O Recife e as novas Idéias Reformadoras
Já em 1802, um manuscrito da lavra do Bispo Azeredo Coutinho, oficiando à Câmara de Igarassu, é pleno de evidências quanto ao conhecimento das idéias de Rosseau em Pernambuco. Em 1829, o “Diário de Pernambuco” divulga acusação de um aluno contra Moura Magalhães nesses termos: “Entusiasta da demagogia, que não senão em Rosseau, Helvecio , La Mettrie, e nos direitos inalienáveis do homem, na regeneração do gênero humano, na injustiça da escravidão, nos horrores do despotismo, na fogueira do Santo Ofício, na inutilidade dos padres, na tirania dos reis […]”. Em 1831, “O Olindense” informa “os publicistas que andam nas mãos de todos”: Montesquieu, Bentham, Benjamin Constant, Rosseau. As teses de Bentham parecem ter sido bem acolhidas em Recife; seja pelos anúncios de livros quanto pelos extratos publicados em jornais e polêmicas suscitadas. O pensamento de Pascal também alcança um círculo de leitores, através dos enciclopedistas franceses.

Em 1830, a loja Ponchet anuncia Pascal e outros autores. Ainda que não indique as obras, a loja relaciona Voltaire, Rousseau, Racine, Corneille, Volney, Pudendorff, d’Aguesseau, Mably, Fenelon, Moliére e Montesquieu: “são os melhores autores e chegados ultimamente da França oferecem a vantagem de serem das mais recentes e melhores edições”. Em 1836, anuncia “boa quantidade de livros de literatura francesa, sendo o Cours de Littérature, de La Harpe, o mais vendido; como ainda obras de economia: Smith, Ricardo, Mill, Sismondi, Say, Malthus e a “Revue Mensuelle d’Economie Politique”(onde colaboram Rossi, Blanqui, Sismondi, Walras, entre vários).

Abra-se aqui um parênteses para dizer das dificuldades de acesso aos livros, dado ao rigorismo da censura. O viajante Henry Koster, em clássico relato, registra com pasmo em 1810 a inexistência em Recife de tipografia ou livraria e testemunha o rigoroso controle exercido sobre a entrada de livros no Brasil: ele próprio foi alvo desse rigor, ao enfrentar na aduana o confisco de todos os seus livros, só obtendo liberação já no navio, de volta à Europa. Espanto e desalento também saltam do relato de Antônio Morais e Silva: “Não sei eu, porque maus fados não há nesta terra nenhum alfarrabista de cartilhas e livrinhos de Santa Bárbara; nem ao menos um pouco de espírito comunicativo de cousas boas e de novos frutos que honrem o nome brasileiro” Se as “cousas boas” e os “novos frutos” são de difícil acesso, diga-se que é livre o curso e fácil o acesso à literatura de teor anti-iluminista e anti-revolucionária: Bonald, de Maistre, Chateaubriand e Malthus, que em sua primeira edição anônima é de combate a Condorcet e Godwin: An Essay on the Principles of Population, as it affects the future improvement of society; with remarks on the Speculations of Mr. Godwin, M. Condorcet and other writers. (1798)

O contrabando é a forma de circulação de livros e autores indexados. Relatos de viajantes e autos da Devassa são testemunhos da circulação das “leituras proibidas”. Em depoimento contra Bernardo Luiz Ferreira Portugal, uma testemunha declara que “o reverendo dissera que há seis anos botava livros abaixo para fazer a revolução”. A frase, insistimos nela, “Botar livros abaixo” revela a força da palavra impressa e sua tradução das realidades locais, fundando novas sociabilidades. O que não significa dizer que a presença de livros e de bibliotecas “revolucionárias” constituam garantia de radicalização nas práticas políticas. Neste tocante, recomenda Gláucio Veiga particular cautela quanto às conclusões que se possa chegar em consulta às listas de obras e autores presentes nas prateleiras das bibliotecas públicas ou conventuais; não há garantia quanto à consulta sistemática e as evidências apontam para a difusão das práticas de leitura por dentro de um círculo restrito. Do referido autor é a informação de que “a ‘experiência textual’ com os pensadores e filósofos é precária” e os escritos filosóficos chegam através da obra de Bruecker e no meado do século XIX é o labor de A. Pedro de Figueiredo, divulgando Victor Cousin, que amplia essa “experiência textual”.

Ainda que se aceite como precária a “experiência textual”, não se pode desconsiderar a difusão das idéias iniciadas no século XVIII. Em Kátia Queiroz Matoso, no estudo “Presença Francesa no Movimento Democrático Bahiano de 1798” (sobre a conspiração dos Alfaiates), encontramos o levantamento das bibliotecas de Cipriano José Barata e Hermógenes Francisco de Aguilar Pantoja, com Voltaire, Genovesi e Rosseau, entre vários outros.

Estudos sobre a presença de livros iluministas nas Minas Gerais dos Inconfidentes do final do século XVIII destacam como tendo sido a biblioteca mais revolucionária a do heterodoxo Cônego Luís Vieira da Silva: Voltaire, Diderot, d’Alembert, Marmontel, Luís Antonio Verney, Mably, Antonio Genovenesi (e com ele, Bacon, Descartes e Locke). Mesmo que estudos sobre os inconfidentes de Minas localizem uma “insuficiência teórica” informando os líderes do movimento, destacamos aqui a circulação das idéias e seu desbordamento para o campo político. Neste sentido, é precisa a afirmação de Antônio Cândido quanto ao século XVIII (“a nossa breve Época das Luzes”): sinal de emergência de uma consciência antagônica à “mentalidade jesuítica e legista das elites anteriores, preparando-se para uma concepção mais ousada do papel da inteligência na vida social e das relações entre Metrópole e Colônia”

De Luiz Antonio Verney, o “Diário de Pernambuco” de 07/10/1829 anuncia um volume da sua Lógica (através da qual se conhece Locke), na “Loja de livros defronte do Palácio”. Sua Philosophia Rationalis consta da lista de doações à Faculdade de Direito em 1831, publicada pelo citado jornal. A Lógica, de Genovesi, é o compêndio mais usado, divulgando Bacon, Leibnitz e Locke. Naquele ano é encetado um movimento para angariar doações de livros à referida Faculdade.

João Ribeiro, chamado de padre revolucionário, não apenas teria lido o filósofo Condorcet, como ainda “voltado olhos” ao jornalista em plena revolução em seu jornal Chronique de Paris. O viajante francês Tollenare indica ter conhecido o padre João Ribeiro, dizendo possuir “uma imaginação que andava mais depressa do que o seu século e sobretudo adiantava-se muito à índole de seus compatriotas”, então “arrastado pela leitura de Condorcet”.

Leituras por certo contrabandeadas, uma vez que o controle das tipografias e o rigor exercido pela Mesa Censória em Portugal (um substituto de Pombal à censura jesuítica) e pela Inquisição em Espanha impediam a circulação da palavra impressa. Ilustrativo do controle exercido pela Mesa Censória é um edital de 1770, “condenando à pena de fogo mais de 120 livros, geralmente em língua francesa, mas também em inglês e latim, entre eles obras de Hobbes, Rosseau, Spinoza, Voltaire”, referido por Laurence Hallewell, para quem “Ao estudar a atitude dos portugueses em relação às ‘letras impressas’ no Brasil devemos ter em mente a importância que eles evidentemente atribuíam ao isolamento da colônia de todas as influências externas, uma obsessão que parece ter-se agravado à medida que avançava o século XVIII”.

A prática da censura , aliada às ordens de “queimar as impressoras e derreter os tipos”, explicam, em parte, a forma desigual da difusão das idéias na colônia, mas explicam também o contrabando. Lord George Macartney, passando pelo Rio de Janeiro em 1792, com pasmo registra apenas duas livrarias, ainda assim observando que “aqueles com quem tivera contato se mostravam muito curiosos acerca da última subversão na França”.

O contrabando nos navios não parece ter sido pequeno. Além de livros, os jornais e panfletos chegam ao Recife. Do já citado viajante francês Tollenare é a informação (com pasmo) da circulação de gazetas francesas e dos jornais “O Investigador Português”, “Correio Braziliense” e “O Português”, editados em Londres e de circulação proibida em Portugal e colônias. Registre-se aqui, que em Londres e Paris, após 1814, têm incremento a produção editorial de livros e periódicos em língua portuguesa, atendendo à demanda do comércio ilegal, o que demonstra o crescimento do público leitor. A respeito do comércio editorial de livros em língua portuguesa editados em Paris o estudo minucioso de Vítor Ramos “A Edição de língua portuguesa em França” confirma o crescimento desse comércio até 1850.

As gazetas e as revistas cumpriram destacado papel na difusão das idéias nessas primeiras décadas do século XIX. Não se pode subestimar sua função, pois de múltiplo alcance: ampliar o número de leitores; tornar possível o acesso às recensões e extratos de obras e a divulgação de listas de livros editados na Europa; fonte permanente dos jornais editados na província, alimentando suas colunas de filosofia, literatura e política. Cumpre assinalar o caráter de permanência do jornal à época: fonte de informação, é encadernado e suas coleções são encontradas nas bibliotecas e gabinetes de leitura.

Fontes da época indicam a presença de jornais franceses nas bibliotecas ou gabinetes particulares de leitura, além das revistas. Frei Caneca teria tido contato com a “Revue Enciclopédique” (séc. XVIII) e a Faculdade de Direito registra em seu acervo a “Revue Britannique”(!833-1837), “Edinburg Review”, “The Quartely Review”, “Westminster Review”(1839), “Revue des Deux Mondes” (1835-1837), “Journal de l’Institut Historique”(1834-1836), “Journal des Conaissances Utiles”(1832-1837) , “Journal des Economists”, “Illustration” e “La Revue”.

O acervo da Faculdade de Direito em Olinda é constituído pela Biblioteca dos oratoreanos (entre quatro a cinco mil volumes), doações de particulares, conforme registros de 1831, e doações do Governo Imperial. A criação do curso impulsiona o comércio de livros (as “lojas de livros” ocupam-se do comércio e não mais as boticas, lojas de ferragens ou o pregão dos mascates de porta em porta) e a criação de biblioteca pública em Recife, até então inexistente. Se é certo o incremento ao comércio de livros e em seguida o estabelecimento das casa tipográficas, o curso jurídico enfrenta internamente um “prolongamento da censura”. Os compêndios adotados devem ser aprovados pela Congregação conquanto “estejam de acordo com os sistema jurado pela nação”. O que não significa dizer que os compêndios sejam o material exclusivo dos cursos. Outros textos circulavam: é o tempo das ‘sebentas’ e do início das traduções. Além da biblioteca do curso jurídico, aparecem registros de bibliotecas anteriores à criação dos cursos jurídicos através do relato de Tollenare e outros, referindo a Biblioteca dos Conventos (de São Bento, do Carmo, de S. Francisco), de particulares abastados, quadros da burocracia.

Convém sublinhar que a implantação dos cursos jurídicos, além do incremento do comércio de livros, aumenta a população de estudantes, faz nascer os círculos de leituras, as sociedades literárias e as folhas estudantis. São vários os títulos que aparecem por todo o século XIX, além da colaboração em outros periódicos. As folhas estudantis, no espírito da época, intitulam-se de literárias, filosóficas, políticas e participam dos debates em voga.

Um dos temas mais caros à imprensa do período é “o combate à ignorância política”. O “Olindense” chega a apoiar mensagem à Câmara dos Deputados propondo que o governo traga ao Brasil “escritores modernos” (Charles Comte, Dunnoyer, Droz, Jouy, entre outros), “para ensinar ciências sociais”. Uma anotação de Gláucio Veiga é relevante para nosso estudo: Dunnoyer e Charles Comte, fundador e redator respectivamente de “Le Censeur Européen”, no período ainda então “impregnados de saintsimonismo”, teriam chegado aos estudantes de Olinda através da gazeta francesa ( que repercutiria inclusive no título de alguns jornais, em Pernambuco e no Rio de Janeiro) e da obra do primeiro: L’Industrie et la Morale considerées dans leurs raports avec la liberté, de 1825.

Sobre a influência dos chamados socialistas utópicos, o já citado Gláucio Veiga, estudando as idéias do Padre Lopes Gama, a quem considera “descartado da tradição revolucionária pernambucana”, não obstante ser um anti-escravagista e anti-absolutista, um “constitucionalista”, conclui que “o eixo ideológico de Lopes Gama estrutura-se saint-simoniano”. Fundamenta sua assertiva na leitura dos vários escritos de Gama, destacando “Melhoramento da Sorte das Classes Industriosas” de 1845, onde afirma que “em nossos dias, três homens distintos têm tentado o melhoramento das classes laboriosas, mediante a reforma da sociedade em geral: St. Simon, Fourier e Owen”.

Ao comércio de livros feito na lojas vêm ajuntar-se as primeiras tipografias. Manoel Figueiroa de Faria, em 1831, ao lado de sua loja de livros em Olinda abre uma tipografia, editando os primeiros livros de Pernambuco: obras de Direito, mas também traduções do francês de Voltaire, Stuart Mill, Erasmo, Bentham. Desse período é a importante publicação em Recife do livro Direitos das Mulheres e Injustiça dos Homens, da feminista pioneira Nísia Floresta (Dionísia Gonçalves Pinto), uma livre adaptação da obra de 1792 de Mary Wollstonecraft, Vindication of the rights of women.

O referido Manoel Figueiroa de Faria, em 1845 expõe em sua livraria várias publicações que chegam da França, por encomenda de Vauthier: Almanack Phalanstérien, Les Enfants au Phalanstére, Débacle de la Politique, Notions de la Science Sociale Vie, de Chrales Fourier, Examen e Défense du Système, de Fourier, Exposition Abrégée du Sistème de Fourier, Trois Discours, De la Politique Nouvelle, Solidarité, Nouveau Monde Industriel, Petit Cours de Politique et d’Economie Sociale, entre outros. Praticamente a mesma lista de publicações, em quantidades que variam de 2 a 12 exemplares, com predominância de Fourier, estão à venda no mesmo período com o livreiro Coutinho; donde se infere ser intenso o trabalho de Vauthier, ampliando o círculo de leitores e possíveis adeptos do fourierismo no Recife, como é o caso de Antonio Pedro de Figueiredo .

III – Antonio Pedro de Figueiredo: a revista O Progresso e Vauthier
Alfredo de Carvalho, dos primeiros a divisar a contribuição intelectual de Figueiredo, embora restringindo-o ao campo do jornalismo, lança luzes sobre essa personalidade adiantada a seu tempo, encontrando nele leituras modificadas ao influxo de Owen, Saint-Simon e Fourier. Gilberto Freyre, em O Nordeste, avança na apreciação do intelectual e dimensiona seu papel como “revolucionário intelectual do meio escravocrata do Nordeste e como crítico da organização patriarcal”. Amaro Quintas, tomado de admiração por Figueiredo após a leitura de “O Progresso”, envida esforços para sua reimpressão, acatando a recomendação de Freyre para que A. P. Figueiredo não permanecesse tão na sombra, tão no escuro, tão dentro da alcunha [Cousin Fusco] que lhe deram os conterrâneos ( sempre tão apedrejadores dos profetas)”.

Amaro Quintas, em eloqüente apresentação da reimpressão da revista “O Progresso”, chama atenção para o lamentável fato que conduz ao apagamento de campos significativos da história das idéias socialistas no Brasil. Antônio Pedro de Figueiredo é um dos “esquecidos”. Aqui se quer tratar de seu imenso labor de intelectual engajado, não sucumbindo ao impulso da “enorme condescendência da posteridade” , para usar a feliz expressão de E. P. Thompson, mas alcançando o homem e a obra no seu tempo. De suas idéias expostas n’O Progresso, como em outros periódicos, seus exegetas, em particular A . Quintas, localizam pontos luminosos de “verdadeiras antecipações”. Em virtude de seu avanço em relação aos quadros intelectuais da época, Quintas situa-o como “um precursor da ciência social” no Recife e como “um dos mais lúcidos estudiosos de nossa realidade sociológica”.

De tudo o que Amaro Quintas observa acerca do pensamento de Figueiredo, importa reter um ponto para o estudo das idéias socialistas e sua aplicação à realidade brasileira: ” [ na obra de Figueiredo encontramos] o socialista buscando uma solução para os problemas de então em função dos postulados do socialismo dito utópico da primeira metade do século passado e o estudioso objetivo preocupado em resolver esses problemas dentro de um estilo realista, dentro das nossas necessidades”. Aliás, o próprio Figueiredo, no artigo de abertura do primeiro número de “O Progresso”, ao mesmo tempo em que afirma-o “asilo ao livre pensamento, às considerações serenas da filosofia e da ciência”, alerta para a tendência à época de “copiar servilmente a Europa”, propondo então o caminho da “aplicação ao nosso país dos dados da ciências sociais”, buscando “os germes de um futuro generoso”.

Aqui vamos nos ater ao encontro intelectual entre o professor e jornalista pernambucano Figueiredo e o engenheiro francês Vauthier, localizando na revista “O Progresso” pontos de influência deste e a interlocução resultante das leituras partilhadas, fornecendo o substrato para as análises sobre o quadro da realidade do latifúndio escravista e a prefiguração de ações políticas desenvolvidas na perspectiva do progresso e da reforma social. Gilberto Freyre localiza com precisão a influência de Vauthier junto a um número expressivo de intelectuais pernambucanos e, em particular, de Figueiredo: “Vauthier contribuiu para que se antecipe no Recife da primeira metade do século XIX o estudo das questões econômicas e sociais brasileiras, dentro do critério socialista.[…] concorre para a irradiação das idéias socialistas francesas nesta parte da província”.

Antônio Pedro de Figueiredo, de origem humilde, inicia-se nas letras sob o amparo dos frades do Convento do Carmo. Muito jovem, vivendo “entre livros”, desenvolve o gosto pela filosofia e torna-se conhecido nos meios literários de Recife, após a tradução da “História da Filosofia” de Victor Cousin e de seguidas traduções acompanhadas de prefácios de Ortolan (Da Soberania do Povo e dos Princípios do Governo Republicano Moderno), George Sand (As Sete Cordas da Lira). Inicia aí seu labor na imprensa pernambucana, nos jornais “A Imprensa”, “Aurora Pernambucana”, “O Lidador”, “Diário de Pernambuco”, em cuja seção “A Carteira’, expende comentários sobre livros, autores, faz recensões, entre outros assuntos sob o pseudônimo de Abdalah El-Kratiff.

A revista “O Progresso” (Social, Literária e Científica), como parte do esforço de aplicação das idéias reformistas no Brasil, circula de 1846 a 1848. Publicação mensal, a revista agrupava suas matérias em algumas seções: Revista Literária, Revista Política (Exterior e Interior), Variedades, Poesia. Além dos artigos de fundo (editoriais), artigos assinados, publica vários trabalhos abordando os temas do Comércio Internacional, Colonização do Brasil, Latifúndio Territorial, Liberdade de Imprensa, Formas de Governo, entre outros. As traduções ocupam grande espaço com os temas da Lei Agrária, O Comunismo na Alemanha, O Socialismo na Suíça, a Doutrina de Saint-Simon, entre outros.

No primeiro número da revista sob a assinatura de L. Vauthier escreve duas notas, versando sobre a inauguração de obras públicas no Recife. Numa nota noticia a inauguração da caixa d’água e dos três primeiros chafarizes provisórios, construídos pela Companhia Beberibe, na Boa Vista. Faz considerações técnicas acerca da melhoria no modo de abastecimento d’água potável como um benefício para a população e faz um apelo à continuidade de tais ações de melhoramentos na cidade: “Este resultado, primeiro parto do espírito de associação em Pernambuco, não se pode conseguir sem grande trabalho, firmeza de caráter, e aturada paciência das pessoas ilustradas, que tomaram parte na direção da Companhia; e é agora de esperar, que as felizes conseqüências financeiras da empresa animem os nossos capitalistas a fundarem novas associações do mesmo gênero, para outros objetos de interesse público”.

Seus escritos sobre as obras públicas estão sempre chamando atenção para o uso correto dos materiais, adequação de procedimentos e inovação quanto ao rebaixamento de custos. Uma pergunta é constante nas críticas que dirige aos serviços de encanamento, empedramento de aterros e outros mais: “Quantas vezes nas artes se conseguem maus resultados no emprego de meios bons em si, mas de que se faz errônea aplicação?”

Em artigo abrindo a seção “Revista Científica”, Vauthier faz uma longa exposição sobre Os Caminhos de Ferro, abordando questões técnicas ligadas à construção das estradas, processos locomotores, sistema por ar comprimido. Apesar de informar que o artigo traz informações “segundo a ciência e a arte do engenheiro”, enfatiza a necessidade da aplicação do sistema de estradas de ferro no país, posto que “a questão não é apenas científica, é também econômico-política”. Para Vauthier, o emprego dos caminhos de ferro representam não apenas o progresso comercial e industrial para muitos países, mas segundo ele “virão a ser dentro em pouco tempo, um dos mais potentes órgãos de paz e associação fraternas entre as nações”

IV – Vauthier e Mure, divulgadores do fourierismo no Brasil
Em 24 de julho de 1840, Louis Léger Vauthier embarca na França com destino ao Recife. O tempo da longa travessia é preenchido com o estudo de português e as leituras: Études Sociales, de J. Lechevalier, Barbier, um folhetim de Philareste (discordando do autor quanto às apreciações feitas sobre o sistema de Fourier), além da leitura da exposição das doutrinas de Saint-Simon estabelecendo as comparações com o pensamento de Fourier, entre outras. Entremeia as leituras com as horas de reflexão sobre o pensamento de Bacon, a recitação de poemas de Victor Hugo, as conversas com os outros passageiros (até a discussão sobre questões sociais).

Uma característica marcante de Vauthier: o desejo de difundir as idéias de remodelação social ressalta da leitura de seu diário. Uma observação recolhida nele afirma esta característica: “Há em mim um desejo imperioso, uma viva necessidade de falar às vezes dessas coisas elevadas que ainda hoje a ciência pressente mais do que explica. Mas bem raras que têm idênticas aspirações e desejos. Tenho então de refletir sozinho, – porém o trabalho solitário do pensamento me é extremamente penoso. As idéias que não posso transmitir perdem para mim todo o encanto”. Sua atitude frente ao conhecimento é orientada pela discussão e o debate desses pontos-de-vista.

Logo de sua chegada encontra em Auguste Millet, um dos técnicos de sua equipe (que viria a ficar definitivamente no Brasil) espaço para conversação sobre o sistema de idéias de Fourier e abordam juntos “idéias sobre a regeneração da humanidade”. Ainda que, aqui e ali, lance mão de um comentário ferino (“Domingo – dia perdido em conversações falansterianas com Millet”), este é alcançado pela matriz fourierista de idéias socialistas. Seus escritos na revista “O Progresso” confirmam a influência de Vauthier; ali o engenheiro Millet na série de artigos intitulados “Interesses Provinciais” apresenta sugestões de projetos de lei à Assembléia Legislativa de Pernambuco. São suas proposições: criação de um Conselho Provincial, com o objetivo de examinar as contas dos órgãos públicos do estado e do município e dos estabelecimentos de caridade subsidiados com verbas públicas; nova circunscrição territorial para a província de Pernambuco; criação de um imposto sobre as heranças e legados de toda espécie; criação de um imposto sobre os rendimentos acima de 200$000 anuais e a criação de um banco popular.

É permanente a ação de Vauthier como divulgador de autores e publicações. Frente à rusticidade do meio, seus pe
didos de livros em França são cada vez mais freqüentes, abastecendo não apenas seu círculo mais próximo, como ainda as poucas e precárias livrarias: a dos livreiros franceses no Recife, Gabriel Bez e Marie Deshayes, e dos livreiros Manoel Figueiroa de Farias e F. Coutinho são exemplos.

Desde sua chegada ao Recife, empreende muitos andanças pela cidade, seus desvãos, seus arredores, engenhos das cercanias e outros mais afastados, anotando mentalmente suas impressões sobre a terra e as gentes. “Então para o observador superficial, que não visse quanta miséria verdadeira se mistura a essas aparência de luxo”, segundo ele, encontraria uma paisagem encantadora – “mas que é tudo isso, meu Deus, no meio de uma população escrava e faminta, no meio de seres que deixam miseravelmente ociosa a mais fecunda e rica natureza que existe sob o céu? ” ( p. 572) Essas visões inspiram o que Vauthier chamou de “amargas reflexões”, resultando uma perspectiva sombria: “Se esse povo seguir a marcha usual dos progressos sociais, está ainda bem longe de atingir estado mais ou menos suportável”. Ainda assim, em suas variações do olhar europeu, ora maravilhado com a luz, as cores e os sabores, ora irritado com a lerda burocracia ou ainda decepcionado com a falta de brilho nas conversações mundanas dos chás e as insípidas polêmicas dos salões, vai pouco a pouco enxergando luminosidade nalguns espíritos.

Atento às manifestações de abertura ao debate das idéias reformadoras, busca contatos e estreita laços. Um dos exemplos é a anotação do diário sobre Filipe Lopes Neto (participante da Rebelião Praeira); em quem Vauthier percebe um espírito não “rotineiro”: “soube que ele é falansteriano”, possível de ser “seduzido pelas idéias inovadoras”. As conversas com Filipe Neto giram em torno de informações sobre a empreitada do Dr. Mure na península do Saí, em Santa Catarina.

Alia ao seu trabalho técnico o desejo de conhecer a paisagem social e humana da região. A todo instante se manifestam nele o engenheiro e o reformador social. De sua França não se distancia. Para ele “Ë ainda ali que se encontra o maior número de almas generosas e corações nobres. É ainda ali que há verdadeiras luzes e germes de progresso”.

Os paquetes que chegam e partem levam suas cartas e impressões do Recife e trazem livros, periódicos, gazetas que aos poucos vão encontrando um público afeito ‘às luzes e ao progresso’. Dedica boa parte de seu tempo às leituras. Muitas delas são ligadas às técnicas de edificação, construção, engenharia de pontes, de onde extrai farto material para as soluções urbanísticas requeridas para a Recife de então. No entanto, sua atenção não se descola da experiência de leitura e decifração das idéias reformadoras vigentes na Europa.

Em sua casa , no acanhado gabinete de trabalho, onde escreve seus versos e pinta seus esboços e retratos, muitos títulos e autores se juntam: Introdução à Economia Política, de Say, Confissões, de Rousseau, as Memórias de Delambre, Bouguer e Condamine. Como ainda a presença de Sismondi, Miguet, Michelet, Ravinel, Genings, d’Aubuisson, Victot Hugo, Gauthey, Puissant, Volney, entre outros. De sua vária leitura não podiam faltar as gazetas e periódicos franceses: recebe muitos números do “Messager” e é assinante da “Phalange” e “Démocratie”, encadernados em suas coleções disponíveis à consulta de seu círculo intelectual.

A provisão de livros, gazetas, periódicos e outros impressos é feita de Paris por F. Cantagrel. No Diário de Vauthier encontramos seguidas anotações, que se vão avolumando, de pedidos de publicações: os livros Le Fou, Paget, assinaturas de “Phalange”, coleções completas da obra de Fourier. Observe-se que Vauthier preocupa-se também em divulgar na França as notícias sobre os avanços no Brasil das “idéias inovadoras’. Para Cantagrel se destinam não apenas pedidos de publicações, como ainda as notas de Vauthier sobre a colônia de franceses que se instalara no Saí sob a orientação do Dr. Mure, impressos do próprio médico francês, exemplares do “Jornal de Pernambuco”, do “Diário do Commercio” do Rio de Janeiro (com matérias sobre a experiência falansteriana do Saí), do “Socialista da Província do Rio de Janeiro”, de “O Progresso”, de Antonio Pedro de Figueiredo.

Das observações do meio físico e social, da sistematização das leituras vai retirando o material a partir do qual firma sua influência, de repercussão duradoura e significativa, como divulgador do fourierismo no Recife. Começa a colaborar em periódicos locais e estreitar a correspondência com a “Phalange”, bem como desenvolver seus estudos ligados aos arranjos técnicos que favoreçam a remodelação urbana de Recife. Fruto das observações feitas no período é seu estudo Des Maisons d’Habitation au Brésil, para a “Revue Générale de l’Architeture”, publicada em 1853. Acerca das várias contribuições de Vauthier (e sua equipe) veja-se extrato do artigo publicado na revista “O Progresso”, quando de sua partida do Recife:

“A organização de uma administração uma e hierarquicamene ordenada, a substituição dos processos científicos e exatos as apreciações empíricas, até então em voga, orçamentos claros e precisos quanto aos preços e quantidades, susceptíveis de serem verificados por todo aquele que possui conhecimentos na arte de Engenheiro, economia de cento por cento no custo das porções de estradas executadas, trabalhos feitos com solidez, elegância e economia, não são ainda senão uma parte dos serviços prestados a nossa província pelo hábil engenheiro das pontes e calçadas de França, serviço que só há podido escurecer a cegueira do espírito de partido e de interesses particulares”.

Já se viu que o esforço permanente de Vauthier no tocante à divulgação de idéias é alargar o círculo de leitores, tornando as leituras sistemáticas. É o caso de passar rapidamente do hábito de empréstimo dos jornais recebidos da França para formar um público de assinantes, o que torna possível ampliar as práticas correntes de leitura, visto que um mesmo jornal é sempre lido por vários pessoas e em seguida objeto de coleção e provisão de extratos para a imprensa do Recife, como é o caso da revista “O Progresso”. Entre os nomes anotados em seu Diário como assinantes da “Phalange” ou do “Démocratie”, como ainda recebendo folhetos e livros: o Barão da Boa Vista, Soares de Azevedo, Antonio J. de Miranda Falcão, Antonio Borges da Fonseca, Antonio J. de Sousa Castro Figueira de Melo, Maciel Monteiro (médico), J.C. Bandeira de Melo (professor e advogado) José Bento da Cunha Figueiredo (advogado), Antonio Pedro de Figueiredo (jornalista e professor), Carneiro da Cunha (magistrado), Paula Batista (professor) entre outros; e os franceses Millet, Buessard, Brosser, Morel, Saisset, Boulitreau .

Tal é o interesse em firmar uma audiência das novas idéias no Recife que, tão logo é informado da transformação de “Phalange” em jornal diário, trata de encaminhar à França uma lista, de sua iniciativa, de quinze subscritores de ações. Exemplo claro de intercâmbio e auto-sustentação das publicações. Anote-se aqui o interesse de Vauthier em relação às publicações e o intercâmbio com o Rio de Janeiro. Recebe coleções do “Socialista da Província do Rio de Janeiro”, distribuindo-as com alguns dos já referidos assinantes de “Phalange” ou “Démocratie”.

Seu intercâmbio com o Rio de Janeiro é certamente facilitado pela significativa presença francesa no ramo editorial e do comércio livreiro na capital (Plancher, Villeneuve, Mougenot, Bossange, Aillaud, Laemmert, Garraux, entre outros). O editor francês Plancher já em 1827 anuncia alentado acervo (com a predominância dos textos políticos) trazido da França: d’Alembert, Condillac, Guizot, Pitt, Diderot, Mirabeau, Montesquieu, entre outros. Na descrição da Rua do Ouvidor no Rio de Janeiro, feita por Joaquim Manoel de Macedo, entre os vários livreiros ali instalados (Villeneuve, Garnier, Cremiére, Firmin Didot) destaca a livraria de Louis Mongie. Macedo em suas “Memórias da Rua do Ouvidor” destaca Mongie como livreiro de instrução variada e conversação ilustrada, tendo sido sua livraria “preciosa fonte de civilização, freqüentada pelos homens de letras e pelos cultivadores das ciências que achavam nela os melhores livros de publicação recente”.

Ademais, o afrancesamento do Rio como do Recife, é fenômeno largamente estudado. Hallewell, em seu História do livro observa com precisão a “receptividade excepcional [no Brasil] a todos os adornos da cultura francesa”, acrescentando que chegava-se a “identificar tudo o que era francês como moderno e progressista”. Como teriam anotado os viajantes Kidder e Fletcher sobre a quantidade de publicações francesa nas livrarias sobre “ciência, história e filosofia atéia”, o gosto disseminado das traduções de romances franceses, posto que até as mulheres liam “a maior parte das obras de Balzac, Sue, Dumas, George Sand”. É nessa ambiência de afrancesamento que Vauthier tenta recolher prosélitos e difundir as idéias francesas de regeneração social.

Da intensa atividade de Vauthier no Recife chegando ao meado do século XIX, destaque-se aqui três campos: o recurso da técnica (construção do Teatro Santa Isabel, pontes, levantamento de mapas, soluções de equipamentos urbanos de encanamento e moradia, introdução de maquinaria, administração de obras públicas, entre outros), o estudo da paisagem humana e social (higiene de habitação, relações entre o espaço público e o privada, o mundo dos senhores e dos escravos, a cultura política, as relações de trabalho, a propriedade da terra, a família patriarcal, relações inter-étnicas, a vida privada, hábitos, costumes e tradições, entre vários) e a ampliação do debate em torno das idéias de “regeneração humana” ( distribuindo publicações, colaborando na imprensa, divulgando novas leituras, intercambiando experiências e estudos, conectando as idéias e os experimentos de progresso social no Recife, Rio de Janeiro e Santa Catarina e destes com a Europa, alargando o círculo de leitores intelectuais e progressistas, alimentando polêmicas, ampliando o mapa das idéias socialistas no Brasil).

Quando Vauthier parte de volta para França, em 1846, o Recife tinha-se tornado num centro de debate das novas idéias de reforma social e, por isso, não é de estranhar que foi nessa cidade que Abreu Lima, o ex-general de Bolívar e filho do revolucionário Padre Roma (fuzilado em 1817), publicou o primeiro livro O Socialismo, onde fala das idéias de Lamennais, Saint Simon, Owen, Fourier, referindo-se também a Godwin e Proudhon.

As idéias de reforma social que começaram a chegar ao Brasil na década de 40 do século passado, coincidiram com o primeiro impulso que haveria de transformar lentamente o Brasil monárquico, rural e escravagista em uma República oligárquica que iniciaria a industrialização e urbanização do país. Por essa razão as idéias modernizadoras de Benoit Jules Mure, médico da cidade de Lyon que aderiu ao fourierismo quando vivia na Sicília em 1839, idealizador da Colônia do Saí, tiveram um ampla receptividade na imprensa da época, tendo o Jornal do Comércio, do Rio de Janeiro, divulgado amplamente e debatido seu projeto associativo.

Nessa mesma época em que Vauthier, no Recife, divulgava Fourier, o médico Benoit Jules Mure dava, no sul do Brasil, em Santa Catarina, os seus primeiros passos para instalar um falanstério. Trazia consigo um projeto amadurecido em França de criação duma comunidade falansteriana, tendo por base as idéias de Fourier. Com esse objetivo fora criada em França uma sociedade, a “Union Industrielle”, que tinha como finalidade divulgar e apoiar a implantação de uma comunidade societária no Novo Mundo.

Através do “Jornal do Comércio” começou Benoit Mure, em dezembro de 1840, a divulgar suas idéias, e embora não ocultasse o caráter reformador e progressista, procurava cativar o apoio dos políticos e elites brasileiras principalmente prometendo trazer para o nosso país um grande número de operários e especialistas que iniciariam a manufatura de máquinas a vapor, uma novidade tecnológica num país ainda eminentemente agrário.

Esse projeto – que correspondia ao desejo modernizador de alguns setores das elites brasileiras – logo chamou a atenção da corte, tendo Mure sido recebido pelo Imperador e obtido promessas de apoio do governo imperial. Apoio que logo se traduziu na possibilidade aberta para que o médico fourierista embarcasse em navio da Marinha, percorrendo a costa do sul do Brasil em busca do local ideal para localizar seu projeto. Acabando por se decidir pela Península do Saí, em frente a São Francisco, já que aí havia terras disponíveis e estava perto do porto, o que possibilitaria a exportação das máquinas a vapor, que pensava ser a principal produção da colônia, para o Rio e São Paulo.

Em Julho de 1841, a Câmara de Deputados aprovou um empréstimo de 64 contos de réis, para apoiar o início do projeto. Em Janeiro do ano seguinte desembarcaram os primeiros franceses em São Francisco. No entanto, problemas resultantes de divergências pessoais e políticas entre Mure e Derrion, provocariam uma divisão entre os franceses, originando a criação de duas colônias a do Palmital e a do Saí.

As duas colônias logo se viram confrontadas com uma realidade adversa: o apoio prometido pelo governo foi limitado, a localização inadequada, tendo os utopistas franceses de lutar por sobreviver no meio da mata atlântica, em condições difíceis e desconhecidas, uma situação agravada pelo fato de serem na sua totalidade operários e artistas provindos do mundo urbano. Todas estas dificuldades levaram a que muitos dos franceses que vinham com destino à comunidade acabassem ficando no Rio de Janeiro, não chegando a integrar a experiência.

Relatórios de inspetores do governo de 1842 e 1843, embora favoráveis à experiência, apelavam a que fossem tomadas medidas urgentes de apoio ao empreendimento. Na prática pouco foi feito, o que certamente determinou a frustração do projeto econômico da colônia industrial. Quanto ao projeto societário, do falanstério – caso a experiência fosse mais duradoura -, certamente se confrontaria com outros e não menos graves problemas: como realizar uma sociedade ideal, no micro espaço de uma comunidade isolada?

Não se sabe ao certo quantas pessoas fizeram parte das colônias, embora Mure tenha afirmado em 1844, depois de abandonar o Saí, que tinha trazido quinhentos operários para o Brasil. O que acaba sendo confirmado pelo cônsul francês que pediu providências para impedir a vinda de mais franceses, preocupado com o número de conterrâneos que apareciam na embaixada em busca de apoio.

Desses franceses alguns permaneceram no Brasil, alguns outros regressaram a França, outros ainda foram para o Uruguai, tendo algumas famílias ido para o Texas, Estados Unidos, integrar uma nova comunidade fourierista (La Reunión), fundada em 1854 por Victor Considérant, o mais importante continuador de Fourier.

Benoit Mure abandonou a experiência e foi para o Rio de Janeiro onde viveu de 1843 a 1848. Na capital montou uma clínica homeopática, sendo um dos primeiros divulgadores dessa medicina, distinguindo-se também por atender escravos e pessoas sem recursos. Travando famosas polemicas com os defensores da medicina alopática.

A frustração de seu projeto comunitário não esmoreceu sua crença no fourierismo, mantendo uma grande atividade no Rio de Janeiro de divulgação de idéias, tendo fundado com outros franceses o jornal “O Socialista da Província do Rio de Janeiro”, um dos primeiros periódicos socialistas do Brasil e da América Latina. Jornal que o engenheiro Vauthier divulgava no Nordeste.

Mesmo de curta duração, as comunidades do Saí e Palmital foram importantes, já que o processo que originou tais experiências foi amplamente discutido na imprensa da época, gerando um debate em torno de temas fundamentais como a necessidade de reformas sociais, de industrialização, de abolição da escravatura e de modernização do Brasil. Impulso modernizador que viria a ter continuidade na obra mais pragmática de Irineu Evangelista de Souza, o Visconde de Mauá, que alguns estudiosos consideram influenciado pelas idéias de Saint Simon.

A vinda dos fourieristas ampliou o interesse no Brasil para idéias novas que começavam a nascer na Europa e que questionavam a forma de organização social dominante e procuravam alternativas societárias. Nas décadas seguintes o interesse pelas idéias precursoras de Owen, Saint Simon e Fourier iriam se expandir às dos socialistas da Geração de 48, em particular Proudhon. Desembocando no nascimento dos primeiros grupos de militantes socialistas na última década do século e no sindicalismo revolucionário.

V- Colônia Cecília, uma nova experiência comunitária
Como escreveu Carlos Rama no seu livro Utopismo Socialista: “O Utopismo prolonga-se no anarquismo muito mais que em outras correntes socialistas do século XIX”.

Esse impulso por um socialismo experimental que tinha influenciado partidários de Fourier, Owen e, depois, de Cabet, trouxe ao Brasil em 1890 um primeiro grupo de italianos decidido a fundar uma colônia socialista experimental, a Colônia Cecília. Nessa mesma época, outros emigrantes começavam a chegar fugindo da miséria e da perseguição política na Europa. Seriam estes trabalhadores que dariam uma contribuição decisiva na divulgação das idéias socialistas e do sindicalismo no país. Como nos 40, com Vauthier e Benoit-Mure, as novas idéias nascidas na Europa penetravam no Brasil junto com os emigrantes.

A Colônia Cecília nasceu da iniciativa de Giovanni Rossi (1856-1943), médico veterinário e militante anarquista italiano, que defendia a necessidade de colônias socialistas experimentais onde fosse testado o projeto social libertário. Depois de escrever Un Comune Socialista, popularizando seu projeto de uma comunidade libertária, Rossi fundou, em 1886, na cidade de Bréscia, o jornal Lo Sperimental, dedicado à defesa da fundação de colônias experimentais e onde divulga o pensamento dos socialistas utópicos e dos anarquistas. Depois de algumas experiências na Itália, Rossi decidiu implantar uma comunidade no Brasil, onde iria procurar “experimentalmente, uma forma de convivência social que correspondesse da melhor maneira possível às aspirações de liberdade e justiça”.

O primeiro grupo anarquista embarcou para o Brasil em fevereiro de 1890, chegando a Palmeira, no Estado do Paraná, no mês de abril. Nesta região, onde já existiam uma Colônia Francesa, de famílias oriundas de Avignon, e Colônias Russas, instalaram-se os emigrantes anarquistas para criar sua comunidade, iniciando logo o duro trabalho de desbravamento da mata, para abrir as clareiras para as culturas e para suas casas.

Apesar das outras colônias serem de emigrantes sem definição ideológica, os anarquistas italianos estabeleceram desde a sua chegada boas relações, principalmente com os agricultores franceses, que os ajudariam a se instalar na nova terra. No entanto, imediatamente surgiram as dificuldades de adaptação a uma vida isolada, numa terra estranha, com um clima e um solo bem diferentes, que exigiam uma prática agrícola adaptada às características tropicais. Problemas semelhantes aos que os fourieristas do Saí haviam experimentado décadas antes.

Em fevereiro de 1891 chegou um novo grupo à Colônia, que incluía várias famílias de agricultores, abrindo novas possibilidades para o grupo anarquista pioneiro pouco experiente na lida com a terra. Contudo, uma nova dificuldade se colocava: a comunidade não tinha capital, infra-estrutura e uma produção agrícola que suportasse o número elevado de novos membros, que chegou a mais de 200. Alguns conflitos e problemas políticos com as autoridades locais complicaram ainda mais a vida dos anarquistas.

Apesar disso, a Colônia funcionou como pretendia Giovanni Rossi, como um laboratório de experiência sociológica, onde era possível acompanhar a tentativa de criar novas relações de produção, cooperação e amor entre os seus membros. O tema da paixão e do amor, que tanta atenção havia merecido de Charles Fourier, também teve um destaque importante nas análises que Rossi fez sobre a Colônia Cecília: “Para mim, com este amor sem rivalidade, sem ciúme, sem mentira, o nosso experimento socialista se completa e do estudo dos problemas sociais, eleva-se aquele dos sentimentos mais íntimos, mais complexos, mais obscuros, que agitam a psiquê humana”.

O fim da Colônia Cecília foi explicado mais tarde por Rossi: “[A colônia] desapareceu porque foi pobre, e foi pobre porque principiou com pouquíssimos recursos, com pessoas incapazes para os trabalhos agrícolas e porque estava só no mundo, que lhe era economicamente estranho”. Com o desaparecimento da comunidade, por volta de 1894, só algumas famílias permaneceriam no local como agricultores. Os anarquistas se espalharam pelo Brasil, desenvolvendo sua militância nos sindicatos e na imprensa libertária. Giovanni Rossi, depois de viver no sul do Brasil, onde incentivou a criação das primeiras cooperativas rurais, regressou à Itália. Nos seus livros, Cecilia, Comunità Anarchica Sperimentale e Un Episodio D’Amore nella Colonia Cecilia, bem como em inúmeras cartas, Rossi faz um balanço dessa experiência comunitária, que poderia valer também para as Colônias do Saí e Palmital:

“Deves compreender bem isto: que quando uma comunidade, seja agrícola, seja industrial, não tem capacidade e meios de produção suficientes, os seus membros passam melhor, pelo menos aqui, explorados como assalariados dos capitalistas. Esta, para mim, foi a causa verdadeira que preparou, pouco a pouco, a dissolução da Cecília.”.

Conclusão
A história das idéias socialistas no Brasil é bem mais longa e rica que o registro historiográfico feito sobre elas. Necessário, pois, reconstituir suas múltiplas experiências que vão das manifestações do socialismo utópico por volta de 1840, quando Vauthier e Mure contribuem para divulgar as idéias de Fourier e se começam a dar os primeiros passos para a criação da Colônia do Saí e Palmital, em São Francisco, Santa Catarina, e vão ganhando cada vez mais importância com a chegada de exilados da Comuna de Paris (1871) e dos anarquistas italianos que criaram a Colônia Cecília (1890), a que se juntaram, no final do século XIX, outros trabalhadores anarquistas espanhóis e portugueses.

O estudo e análise da ação destes imigrantes e dos brasileiros que a eles se reuniram, principalmente na primeira década do século XX, é condição de possibilidade para apreender a riqueza dos registros históricos firmados através de uma imprensa social combativa que, aliada à outros mecanismos de auto-educação, constróem no Brasil a via de um sindicalismo autônomo e de ação direta que marcaria as lutas sociais e a criação de uma cultura operária anti-capitalista no país.

A idéia de experimentar novas soluções societárias, que resultaram em muitas comunidades no Novo Mundo e que no Brasil originaram o projeto do Falanstério do Saí e do Palmital e da Colônia Cecília, prolongou-se ainda em outras experiências, menos documentadas, como a da Comunidade Futuro, no Avaí, que por volta de 1910, reuniu naturistas e utópicos austríacos e alemães, e a tentativa malograda do anarquista e esperantista francês Paul Berthelot de criar uma comunidade no interior do Brasil, junto aos índios de Goiás, onde morreu em 1910.

Ao testar novas formas de associação, produção e relacionamento humano esse socialismo experimental foi deixando claro que a reorganização da sociedade talvez fosse mais complexa e difícil que o otimismo de muitos no século XIX pretendia. Se em algum lugar inóspito longe do Estado e das poderosas instituições econômicas e sociais, os companheiros de utopia não conseguiam fazer vingar seu projeto de uma (pequena) nova sociedade, isso merecia uma análise cuidada. Poucos atentaram a este problema dentro do movimento socialista que começava a ganhar corpo.

Giovanni Rossi, com seu espírito curioso e metódico, dedicou uma atenção especial ao problema, já que para ele a Colônia Cecília era a concretização desse socialismo experimental que iria testar as idéias de reorganização social. Suas análises valem, em grande medida, para as diversas experiências comunitárias realizadas na época, mas que poderia aplicar-se às experiências feitas no nosso século.

Rossi reconhece que a raiz dos problemas que inviabilizaram as chamadas comunidades utópicas do século XIX não reside apenas nas formas de organização e produção e na relação entre essas experiências isoladas e a sociedade e a economia envolventes. Embora ele detalhe problemas como a falta de capital, recursos, experiência de trabalho, impossibilidade de definir pactos de cooperação etc., muitos dos fracassos poderiam ser atribuídos à condição humana ou, se quisermos usar outras palavras, aos condicionalismos psicológicos e culturais dos participantes dessas experiências.

Superar as tendências agressivas, egoístas, o poder, o ciúme, ou o espírito de concorrência, num grupo humano é bem mais complexo que a adoção de uma engenharia falansteriana ou de um ideal libertário.

Foi o que mostraram, de forma clara, as comunidades fourieristas, comunistas e anarquistas, deixando como lição que os processos de reorganização da sociedade e a criação de uma nova economia social pressupõe mudanças radicais na cultura e nos comportamentos que, possivelmente, exigem prazos longos que dificilmente são compatíveis com as necessidades urgentes do quotidiano produtivo e afetivo de um grupo humano.

De forma mais trágica, comprovou-o, no nosso século, a macro-experiência do chamado “socialismo real”, deixando claro as dificuldades de uma ampla e profunda reorganização social. Se os utopistas do século XIX resistiram aos seus fracassos e muitos aprenderam com eles, os fracassos do século XX, pela sua dimensão social e dramaticidade humana, resultaram na atual descrença generalizada na própria viabilidade de uma reorganização profunda da sociedade moderna e na perda do espírito utópico.

Após mais de 150 anos de tentativas de socialismo experimental, para usar o termo de Giovanni Rossi, impõe-se àqueles que, social, política e intelectualmente, estão insatisfeitos com a realidade do mundo, retomar a herança de utopia e esperança dos primeiros socialistas. Mas, acima de tudo, sua capacidade de experimentar, sempre reafirmando sem desânimo, após cada fracasso, a idéia de que o homem e a sociedade podem ser diferentes. Radicalmente diferentes.

(*) Historiadora, professora da Universidade Federal do Ceará – Brasil.

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ANEXO
CRONOLOGIA DO UTOPISMO E SOCIALISMO NO BRASIL

1794 – Nasce em Pernambuco José Abreu Lima, futuro general de Bolivar, filho do revolucionário Padre Roma, fuzilado em 1817 pela sua participação na Insurreição que aconteceu nesse ano.

1798 – Na Conspiração dos Alfaiates na Baía estão presentes as idéias iluministas e radicais que influenciaram a Revolução Francesa.

1808 – A corte portuguesa transfere-se para o Rio de Janeiro, fugindo do exército napoleonico.

1817 – Insurreição em Pernambuco influenciada pelas idéias republicanas francesas. Padre Roma é um dos agitadores.

1822 – Independência do Brasil.

1836 – Garibaldi chega ao Rio de Janeiro iniciando uma permanência de doze anos na América latina.

1839 – Benoit Jules Mure, declara-se fourierista.

1840 – Mure cria em França a Union Industrielle visando fundar um falanstério em Santa Catarina, Brasil e passa a divulgar seu projeto através do Jornal do Comércio, do Rio de Janeiro. Louis Léger Vauthier vem para o Recife assumir o cargo de engenheiro da Repartição de Obras Públicas.

1841 – Inicia-se a experiência do falanstério do Saí e do Palmital, em São Francisco, estado de Santa Catarina.

1844 – Borges da Fonseca fala das idéias de Fourier no jornal O Nazereno.

1845 – Mure edita no Rio de Janeiro o jornal fourierista O Socialista da Provincia do Rio de Janeiro. Vauthier mantém contatos com Mure e divulga no Recife o novo jornal bem como publicações fourieristas francesas. No livro Melhoramento da Sorte das Classes Industriosas, Lopes Gama fala de Saint Simon, Owen e Fourier.

1846 – Antonio Pedro Figeiredo publica, no Recife, a revista O Progresso, influenciado pelas idéias fourieristas de Vauthier. O engenheiro francês regressa ao seu país.

1847 – Irineu Evangelista de Souza, Barão de Mauá, que segundo alguns autores foi influenciado pelo saint-simonismo, começa a ganhar projeção com seus projetos industriais.

1848 – Revolução Praieira em Pernambuco com participação de setores progressistas influenciados por idéias socialistas utópicas. O jornal A Reforma exalta as idéias republicanas francesas e fala de Proudhon. Acaba a revista O Progresso, que foi influenciada por idéias fourieristas. Dr. Mure regressa a França.

1851 – Aparece em França o folheto Imposto Progressivo de autoria de Louis Legér Vauthier.

1852 – O jornal A União debate as idéias socialistas e fala de Proudhon.

1853 – O jornal O Brado do Povo, publica vários artigos sobre as idéias socialistas falando de Fourier.

1855 – O ex-general de Bolivar José Ignácio de Abreu e Lima publica o livro O Socialismo, no Recife, onde analisa as novas idéias.

1856 – Nasce em Pisa Giovanni Rossi.

1858 – Nasce em Sergipe Silvério Fontes um dos mais ativos militantes socialistas do século XIX.

1859 – Morre pobre, em 21 de agosto, o intelectual mestiço Antonio Pedro Figueiredo o mais combativo e polêmico defensor de reformas sociais no Brasil que foi influenciado pelas idéias de Fourier.

1869 – O general Abreu Lima morre pobre no Recife, a Igreja impede que seja enterrado no cemitério católico sendo, por isso, enterrado no cemitério protestante.

1871 – Vários revolucionários da Comuna de Paris exilam-se no Brasil.

1872 – O jornal do Recife O Seis de Março, expõe as idéias de Karl Marx.

1873 – O jovem Rossi adere à Associação Internacional dos Trabalhadores (AIT).

1875 – Rossi forma-se em veterinária na Universidade de Pisa.

1878 – É publicado em Milão a primeira edição de Un Comune Socialista, onde Giovanni Rossi expõe os princípios do socialismo experimental. Nasce em Portugal Neno Vasco um dos principais jornalistas e intelectuais do anarquismo em Portugal e no Brasil.

1881 – Nasce em São Paulo, Edgar Leuenroth, um dos mais conhecidos e ativos militante anarco-sindicalistas brasileiros.

1882 – Nasce em Minas Gerais José Oiticica ativo intelectual anarquista.

1883 – Rossi participa de uma cooperativa agrícola em Bréscia. Tobias Barreto, professor de direito no Recife fala sobre as idéias de Marx.

1885 – Rossi divulga no jornal La Favilla o projeto de uma comunidade socialista, desencadeando críticas de Andrea Costa e Errico Malatesta.

1886 – Rossi funda o jornal Lo Sperimental onde divulga suas idéias e o projeto de uma comunidade socialista. O jurista Clóvis Beviláqua expõe as diferenças entre as várias correntes socialistas.

1887 – Rossi participa da criação da Cooperativa Agrícola Cittadella. Nasce Maria Lacerda Moura militante anarquista individualista e precursora do feminismo no Brasil.

1888 – Morre o Visconde de Mauá. Abolição da escravatura.

1889 – Implantação da república pelo exército influenciado pelas idéias positivistas. Silvério Fontes divulga em São Paulo as idéias socialistas reformistas.

189