Geografia

Globalização e Mundo do Trabalho

Globalização e Mundo do Trabalho: a Emergência de Novas Bases para a Educação Escolar?

Por: ELISA PEREIRA GONSALVES e LEOMARCOS ALCANTARA FORMIGA

O processo de globalização tem trazido consigo a emergência do paradigma tecnológico que afirma como tendência a construção de um novo trabalhador, qualificado e escolarizado. O presente texto pretende refletir sobre as mudanças que estão ocorrendo no mundo do trabalho e que têm remetido para novas e complexas questões para o âmbito da educação.

Buscamos levantar algumas questões que consideramos essenciais, entretanto, deparamo-nos com as dificuldades e limites próprios de quem se aventura a esboçar uma análise – mesmo que breve – sobre um tema tão recente. Sem dúvida, pensar o processo de globalização supõe riscos – necessários.

É neste sentido que esse texto se insere: na perspectiva – ainda um pouco desconfiada – de adentrar no debate inadiável, quando a referência é a educação e a qualificação de jovens e adultos diante dos possíveis desdobramentos de uma sociedade que se pretende globalizada.

GLOBALIZAÇÃO E COMPETITIVIDADE:
OS (DES)CAMINHOS DO MUNDO DO TRABALHO

No cenário atual, além das características de desempenho no mercado ou eficiência técnica dos processos produtivos adotados, uma nova noção de competitividade vem sendo construída diante das exigências da globalização, a partir de um novo enfoque de Recursos Humanos. Nesta nova lógica, o processo educativo incidirá diretamente no sucesso competitivo por duas entradas: a primeira se refere à qualidade e produtividade dos Recursos Humanos, que está diretamente sob a esfera de decisão das empresas; e a segunda corresponde às políticas educacionais.

Nesses termos, tem-se registrado a ampliação do conjunto de competências básicas necessárias no mundo do trabalho. A economia global coloca como necessidade a qualificação científica e profissional do trabalhador como arma competitiva fundamental. Essa importância do fator humano implicará, ao menos em termos de discurso, na valorização dos sistemas educativos em nível mundial.

Sob a globalização, a competitividade requer aptidões e atitudes que favoreçam uma melhor integração no processo de produção. Delineia-se, então, um novo perfil de trabalhador

que tem que ter conhecimentos básicos sólidos, grande capacidade de aprendizado, de ser treinado e treinar-se para o exercício de funções renovadas e reformuladas, ter iniciativa para se defrontar com o imprevisto, cada vez mais comum nas situações cotidianas, e ter polivalência e capacidade de comunicação.

Considerando os dados do ECIB (Estudo da Competitividade da Indústria Brasileira), pode-se observar que 47% das empresas têm como estratégia de Recursos Humanos a definição de postos de trabalho visando alcançar a polivalência; 22% definem postos de trabalho de forma estreita, mas incluem, como estratégia, o incentivo aos trabalhadores a executarem tarefas fora da definição dada. Assim, pode-se registrar, como tendência, que 69% das empresas desenvolvem uma política de Recursos Humanos que inclui a possibilidade do trabalhador ser polivalente, assumindo postos de trabalho fora da primeira definição dada.

A compreensão de polivalência merece ser problematizada. Caberia perguntar: qual a polivalência desejada? seria a polivalência rotineira, que exigiria do trabalhador a execução de mais tarefas, só que semelhantes àquelas que executava anteriormente, sem que haja uma mudança na qualificação profissional? ou seria a polivalência qualificante, que exigiria do profissional o domínio de todo o círculo produtivo, incluindo a possibilidade de intervir ativamente no processo produtivo, o que exige um maior conteúdo profissional?

Qualquer que seja a motivação, a baixa escolaridade dos trabalhadores é considerada “o maior problema da indústria brasileira”, por resultar “em dificuldades de adaptação aos novos requisitos, mesmo quando se trata de treinamentos operacionais”.

Nesses termos, o atual processo de mudança no mundo do trabalho assume um novo paradigma de produção industrial – o paradigma tecnológico – que aponta para um novo trabalhador, mais escolarizado e participativo, contrapondo-se aos trabalhadores especializados e desqualificados da produção fordista.

Em busca de soluções, o mercado tem exigido trabalhadores mais escolarizados – os trabalhadores da Grande São Paulo que tinham cursado até a quarta série respondiam, em 1988, por 35,04% das vagas no mercado de trabalho, enquanto em 1995 representavam 27,26%. Por outro lado, nota-se a elevação na taxa de ocupação de pessoas mais escolarizadas: em 1988, os trabalhadores que tinham no mínimo segundo grau completo respondiam por 20,3% das vagas, e em 1995 passaram a responder por 28,6%.

Devemos registrar que o fenômeno do aumento da escolarização no mercado de trabalho não vem isolado, ele carrega consigo duas más e evidentes companhias: a queda do salário e o desemprego ocasionado pelo desenvolvimento tecnológico ou pelo atraso tecnológico. Nas palavras de Mattoso,

o surgimento deste novo trabalhador tem uma contrapartida, independentemente das diferentes visões prospectivas. (…) Trata-se da crescente massa de trabalhadores que perde seus antigos direitos e, não se inserindo de forma competitiva, embora funcional, no novo paradigma tecnológico, torna-se desempregada, marginalizada ou trabalha sob novas formas de trabalho e de qualificação, em relações muitas vezes precárias e não padronizadas.

Neste momento, deve-se atentar para a advertência de Asselrad, quando a referência é a implantação de políticas de competitividade:

Acionadas em nome da causa da competitividade, as medidas propostas podem ampliar sua receptividade e ganhar adesão públicas. (…) Em nome da defesa de empregos no longo prazo, muitas destas políticas – governamentais ou empresariais – tendem a justificar demissões no curto prazo, propondo, via de regra, a troca do certo pelo duvidoso. (…) E da mesma forma como no passado justificou-se a necessidade de crescer para depois distribuir, acena-se agora com futuros bons empregos, desde que a nação aceite o enxugamento das estruturas produtivas. Assim é que reduzir custos salariais em nome da competitividade parece ser hoje a prática corrente.

Assim, a crescente pauperização da classe trabalhadora e os índices alarmantes que denunciam a desigualdade social e cultural fazem parte dessa nova teia de relações, não como uma distorção, mas como elementos constitutivos do processo de globalização.

Em que pese a ausência de elementos culturais, sociais e educativos que compõem o fenômeno da globalização, pode-se recorrer, em termos de síntese, ao esforço de Coutinho para caracterizar o processo de globalização nos seguintes pontos:

1. aceleração heterogênea da mudança tecnológica nas economias centrais;

2. reorganização dos padrões de gestão e de organização da produção;

3. integração global dos mercados de câmbio e de títulos financeiros;

4. aumento das concentrações das estruturas de mercados e da propriedade global.

Os sinais do caráter de exclusão da reestruturação capitalista são fortes. Sob a globalização, as contradições sociais tendem a agravar-se nos países dependentes. Nas palavras de Ianni, “a mesma reprodução ampliada do capital, compreendendo sua concentração e centralização, acelera e generaliza os processos de proletarização, pauperização”.

Dados da Organização das Nações Unidas atestam que, em 1960, os 20% mais ricos detinham 70% da renda global, enquanto que os 20% mais pobres ficavam com 2%. Nos anos 90, os 20% mais ricos detêm 83% da renda, enquanto que os mais pobres estão com 1,4%.

Buscando uma metamorfose perfeita entre o local e o global, o singular e o universal, o processo de globalização afirma-se sobretudo como um processo multifacetado, diverso e contraditório. Se por um lado cria condições para alianças e cumplicidades, já que, em escala global, os interesses desterritorializam-se, por outro lado, tensões e divergências tendem a agudizar-se.

Ao contrário da teoria da homogeneização das necessidades e mercadorias, agora sob a pressão das novas tecnologias, a globalização tem materializado os seus pressupostos de interdependência e integração por e sobre as desigualdades e contradições que permeiam as diversidades sociais, econômicas, políticas e culturais de cada país.

Se a nossa análise incorpora a idéia de que o processo de globalização é contraditório e excludente, cabe refletir sobre a identidade do trabalhador que permanece. Esta questão não pode ser esquecida ou colocada de forma marginal nas nossas análises. Devemos atentar para o fato de que muitos dos jovens e adultos trabalhadores de hoje, semi-analfabetos, seguramente não serão os trabalhadores cujo perfil está sendo delineado pelo mercado sob a lógica da globalização. Por outro lado, a extensiva oferta de educação escolarizada não pode ser identificada como um amanhã promissor: o fenômeno da subescolarização persiste nas classes populares.

Chamamos a atenção para o fato de que, além de buscar compreender as relações que estão sendo tecidas entre o setor da produção e o novo perfil educacional do trabalhador, devemos incluir também aquele que nem mais a mão-de-obra terá para vender, porque não terá mais onde trabalhar.

EDUCAÇÃO GERAL SOB A NOVA LÓGICA DO MERCADO
A exigência da escolarização parece afirmar-se como uma tendência do capitalismo. O processo de globalização tem inclusive trazido à tona o discurso que afirma ser o principal recurso da sociedade global o conhecimento, o qual, a princípio, não teria limites e estaria ao alcance de todos. De todos?

Coloca-se que a velocidade das transformações tecnológicas tem demandado não só uma ampliação de conhecimentos mas, sobretudo, uma capacidade de aprender continuamente. Se a máquina a vapor e o motor elétrico são considerados símbolos das duas revoluções industriais, há autores que preconizam a educação universal, o computador e as telecomunicações como os símbolos da terceira revolução.

A materialização eficiente do paradigma tecnológico irá requerer não apenas mudanças em produtos e processos, mas também novas habilidades para realização do trabalho. Coloca-se a importância de melhor utilização dos recursos humanos para aumentar a produtividade.

Investimentos em treinamento passam a fazer parte das preocupações centrais das empresas que se pretendem competitivas. Nas palavras de Boog,

a organização deve se estruturar para melhorar continuamente a sua capacidade de absorver e de fornecer oportunidades de aprendizagem. O capital intelectual passa a ser mais importante e diferenciador que o capital físico ou financeiro. (…) Isto, obviamente, não significa que as organizações devam se transformar em escolas ou universidade, mas que elas possam colaborar com os recursos educacionais da comunidade e usufruir desses mesmos recursos.

É interessante observar a nova base de conhecimentos exigida para a operação de sistemas produtivos que utilizam automação e novas técnicas organizacionais:

Automação Industrial
Atributos…………………….Raciocínio lógico

Concentração

Conhecimento técnico geral

Coordenação motora

Destreza manual

Habilidade para aprender

Conhecimentos…………………Eletrônica

Informática

Geometria

Mecânica

Manutenção

Formas de aquisição…………..Formação profissional

Experiência profissional

Novas Técnicas Organizacionais

Atributos……………………Comunicação verbal

Comunicação escrita

Relacionamento com vários níveis hierárquicos

Aspiração profissional

Conhecimentos

Conhecimento geral

Processo global de fabricação

Gestão da produção

Estatística

Forma de aquisição……………Educação geral
Fonte: Senai. Citado por COUTINHO, Luciano, FERRAZ, João Carlos (Coord.), op. cit., p. 224.

As grandes empresas têm se dedicado a estudar as possibilidades da organização industrial sob o novo padrão produtivo e tecnológico. Autores têm vislumbrado o

nascimento do trabalhador completo, precursor do fim da divisão do trabalho ou uma verdadeira revolução nos processos de trabalho. Em geral estes autores privilegiam o potencial das novas tecnologias em ampliar a flexibilidade, elevar os níveis de educação-qualificação e o perfil ocupacional da mão-de-obra, assim como gerar por si só um trabalho mais humanizado. Suas análises se contrapõem diametralmente à tese da inevitável desqualificação da força do trabalho no capitalismo, resultado da compulsão patronal em assegurar o controle dos trabalhadores, sob a orientação do método taylorista.

Diante dessas novas exigências pode-se indagar: em que espaços está sendo alicerçada a nova base de conhecimentos da força de trabalho proposta pelas empresas? até que ponto a instituição escolar faz parte desse projeto?

Devemos destacar na proposta da nova base de conhecimentos o que cabe à Educação Geral: saber escrever, falar e contar; possuir conhecimentos gerais, noções de psicologia e organização do trabalho e de estatística. Não pretendemos discutir aqui se esses conteúdos são suficientes para o trabalhador compreender criticamente o mundo do trabalho ou se esses são os únicos conteúdos para uma escola que tenha uma proposta pedagógica que assuma o trabalho como princípio educativo. A questão que queremos levantar é anterior: seriam esses os novos indicadores de qualidade do ensino, sob o ponto de vista empresarial? falar em Educação Geral significa, realmente, falar em escola?

Em termos gerais, a proposta da nova base de conhecimentos tem sido associada, na visão dos educadores, aos indicadores de qualidade do ensino. Eles apontam uma tendência histórica de estreitar e dar nova forma e conteúdo à relação escola-empresa, mas caem na tentação de compreender o trabalhador de hoje como o sujeito a quem se estará pedindo mais: as novas exigências do mercado, antes colocadas somente para a elite, estariam se impondo ao trabalhador.

Faz-se necessário, para o desenvolvimento de nossas reflexões, transcrever três recomendações básicas do ECIB para orientar o tratamento da relação educação/qualificação profissional:

É preciso que se estabeleçam novas formas de articulação entre o sistema produtivo e o sistema educacional, visando, simultaneamente, à elevação da escolaridade da população e à qualificação dos recursos humanos. (…) Estas novas formas de articulação devem privilegiar a repartição de responsabilidades entre escola e empresa. O Estado, através dos sistemas públicos de ensino, deve se dedicar à universalização da educação básica – ensino de 1 e 2 graus de educação geral, que é a base da qualificação. A qualificação dos trabalhadores deve ser assumida em comum pelas empresas e pelos organismos dos trabalhadores, levando em conta os seus múltiplos e diferentes interesses. (…) A qualificação profissional diz respeito agora à posse de uma escolaridade básica, de educação geral. Nesse sentido, as empresas, diretamente ou por intermédio de suas instituições educativas (Sesi e Sesc) e de formação profissional (Senai e Senac), devem oferecer oportunidades de ensino supletivo de educação geral aos trabalhadores adutos semiqualificados e de pouca escolaridade, que encontram problemas para o retorno à rotina escolar.

Apesar da proposta acenar para a adequação entre educação e qualificação profissional, incluindo a ação do Estado através da realização de uma Política Educacional que universalize a Educação Básica, compreendida aqui como o ensino regular de primeiro e segundo graus, pode-se perguntar: os mecanismos para efetivar a Educação de Jovens e Adultos, sob o paradigma tecnológico, levam o trabalhador para a escola?

A EDUCAÇÃO DO TRABALHADOR SOB O PARADIGMA TECNOLÓGICO: AINDA O DILEMA ESCOLA-EMPRESA?
Um movimento parece estar se delineando no sentido de criar mecanismos para efetivar a Educação de Jovens e Adultos fora do âmbito da escola. Sob dois eixos se constrói a nossa argumentação: os mecanismos propostos pelas empresas para resolver o problema da subescolarização; e a política do Estado para a Educação de Jovens e Adultos.

O discurso que reitera uma educação de qualidade para todos parece ter incorporado o senso comum. Entretanto, o espaço sugerido para que esse processo se realize merece ser destacado:

Se eu, como empresa, necessito de pessoal com conhecimentos fundamentais para poderem operar com tecnologias mais avançadas e não encontro essas pessoas na comunidade, tenho de alguma forma de desenvolver mecanismos que forneçam o suprimento de habilidades técnicas das quais necessito.

A empresa tende a exigir pessoas com determinados conhecimentos fundamentais. A realidade brasileira mostra que cerca de 20% da população é analfabeta (não decifram códigos). Se ampliarmos o conceito de alfabetização, incorporando, por exemplo, habilidades para compreender manuais, aumentaria significativamente o índice de analfabetismo. Outro dado deve ser destacado: cerca de 2/3 da mão-de-obra brasileira possuem menos de quatro anos de escola.

Que mecanismos são desenvolvidos para que sejam supridas as habilitações técnicas, propícias a um ambiente competitivo?

Resgatar a tentativa de profissionalização do ensino no Brasil parece ser necessário para apontarmos novas questões.

A não implantação efetiva da profissionalização na maioria das escolas da rede pública – fez com que o próprio MEC redefinisse a questão da profissionalização: de obrigatória (Lei 5.692/71 e parecer do CFE 45/72) ela foi suavizada para habilitações básicas (Parecer do CFE 76/75) e finalmente revogada (Lei 7.044/82). Ao mesmo tempo em que se esvaziava o conteúdo de profissionalização da escola, transferia-se o controle do SENAI – Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial, do SENAC – Serviço Nacional de Apoio Comercial – e do PIPMO (Programa Intensivo de Preparação de Mão-de-obra) para o Ministério do Trabalho.

Paralelamente, coloca-se como exigência o repensar das agências de formação profissional. Um dos problemas a serem equacionados pelo Senai, por exemplo, e segundo Leite, do Senai/SP, é o de buscar um mecanismo para enfrentar a crescente demanda por habilidades básicas. Nas palavras de Leite,

nem de longe se supõe que a formação profissional possa substituir educação básica. Mas resta, em países de escolarização precária, como o Brasil, larga fatia de adultos mal-preparados, que dificilmente terão chance ou interesse em voltar à escola. Para esses, é preciso encontrar a fórmula de conciliação sistemática entre qualificações tácitas, dominadas a partir da experiência prática, com o aprendizado de conteúdos conceituais e abstratos.

Diante da subescolarização dos trabalhadores, no Brasil, que não teriam chance ou interesse de retornar à escola, não se propõe a efetivação de uma política educacional que valorize a Educação de Jovens e Adultos; ao contrário, descarta-se o sistema educacional – agora improdutivo – e recorre-se ao âmbito da própria empresa.

Começa inclusive a ser esboçado o discurso ideológico da relativização das diferenças entre o que é próprio da escola e o que é próprio do mundo do trabalho:

A rigor, não é muito clara a separação, do ponto de vista da empresa, entre requisitos de escolaridade e de formação profissional, uma vez que ambos incidem sobre competências e habilidades formalmente adquiridas.

Atualmente, propõe-se para fora do MEC não mais a profissionalização, mas a própria escolarização do adulto trabalhador: é no âmbito da própria empresa que os trabalhadores deveriam ter acesso ao ensino supletivo, que daria a educação geral, a base da qualificação.

Por outro lado, falar em Educação de Jovens e Adultos como iniciativa estatal é lembrar: lembrar de campanhas, programas e sistemas nacionais como Mobral. Em 1990, o governo Collor lançou o Programa Nacional de Alfabetização e Cidadania (PNAC), que não resistiu a mais de um ano de vida na incubadora. Por sua vez, o Plano Decenal de Educação para Todos assume a Educação de Jovens e Adultos como meta, mas não estabelece recursos e com que instrumentos tais metas serão atendidas. Atualmente, nem mesmo no organograma do Ministério da Educação a Educação de Jovens e Adultos pode ser encontrada.

Pode-se registrar também o encerramento do financiamento da Educação de Jovens e Adultos, por parte do governo federal, obrigando alguns municípios a ocuparem esse espaço com recursos próprios.

Essa sucessão de fatos tem sido interpretada por alguns autores como um silêncio do Estado para com a Educação de Jovens e Adultos. No entanto, o silêncio tem um significado: o Estado não acena para uma proposta efetiva para a Educação de Jovens e Adultos e assiste (alegremente?) as empresas assumirem essa tarefa.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
A questão do acesso dos trabalhadores aos bens materiais e simbólicos na sociedade brasileira tem sido reiteradamente denunciada. Os índices alarmantes, que denunciam a desigualdade social, são incorporados ao conjunto de relações tecido pelo processo de globalização não como uma distorção, mas como um elemento próprio, constitutivo.

Nesse novo cenário, novas questões estão sendo postas e a qualificação científica e profissionalização do trabalhlhador é uma delas. Sob a ótica do mercado, emerge o paradigma tecnológico que afirma ser a subescolarização o grande problema da indústria brasileira, que se pretenda competitiva. Ao mesmo tempo, realiza-se um processo através do qual as classes populares estão sendo excluídas do mercado de trabalho e – de forma paradoxal ao discurso que vislumbra o nascimento de uma sociedade do conhecimento – também do mundo escolar.

Por outro lado, a Educação de Jovens e Adultos não resiste no âmbito do Estado e as empresas tendem a investir cada vez mais.

Refletir sobre o papel da Educação de Jovens e Adultos no momento atual parece ser um núcleo fértil no sentido de oferecer algumas indicações não apenas sobre a relação escola-empresa, mas sobretudo para um repensar do tipo de educação que se impõe hoje, para aqueles trabalhadores que, cada vez mais, serão excluídos na sociedade global. Se o desenvolvimento humano, em seu sentido amplo, é assumido como paradigma, a educação dos trabalhadores não pode ser realizada a partir de uma cumplicidade entre a condição de pobreza e a subescolarização, como prevê a proposta da nova base de conhecimentos. Resta, como desafio, (re)construir um novo ponto de partida, uma nova forma de compreensão e de intervenção, que contribua para o desenrolar de novas relações sociais que possam romper com o processo de desumanização, o lado obscuro da globalização.

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