A Distribuição de Renda – A Pobreza e a Fome
É impossível separar a distribuição de renda, a pobreza e a fome, pois estas estão intimamente relacionadas, sendo cada uma causa e conseqüência da outra. Por mais de quinhentos anos a renda no Brasil é mal distribuída. E a renda também está ligada com a posse da terra. Desde o início da colonização, com as capitanias hereditárias, extensas faixas de terras estavam concentradas nas mãos de poucos. Dessa mesma forma, tempos depois, nas mãos dos senhores de engenho e séculos depois nas mãos dos barões do café. Nesse tempo, os trabalhadores e escravos, marginais do processo compunham a classe pobre, quase sempre mal alimentada.
Com a abolição da escravidão a situação da renda poderia ter melhorado, mas a imensa massa de negros foi deixada a própria sorte, sem qualquer tipo de assistência. Os negros libertos geraram as favelas e os trabalhadores rurais, sem terra. A situação agravou-se ainda mais durante a ditadura militar em que o lema “Primeiro crescer, depois distribuir” traduz o porquê da atual concentração de renda. E esta concentração de renda gera a concentração de riqueza, pois apenas aquele que possui uma renda alta pode poupar, empreender e assim enriquecer. Com isso o abismo entre ricos e pobres aumenta.
Atualmente, um dos grandes vilões da má distribuição de renda é o alto preço dos alimentos, que afetam muito mais as pessoas de baixa renda. Para uma família com renda mensal de R$ 200, 50% é gasto com alimentação. Essa porcentagem cai para 15% para uma família de renda de R$ 2000. Dois fatores explicam o alto preço do alimento. O primeiro é o modelo fiscal brasileiro, que sobretaxa produtos ao invés de lucros e investimentos. Por isso o pobre paga mais impostos. Além disso a produção brasileira é voltada para engordar o superávit da balança comercial, que serve para pagar juros e mais juros da dívida externa. Para exportar produtos que poderiam ser consumidos internamente aumenta-se o preço, através de vários impostos, enquanto incentivos fiscais para a exportação são concedidos. Com a diminuição do preço, o pobre pode comprar mais alimentos, por conseqüência diminui-se a fome. Muitas entidades fazem campanhas contra a fome, seja no Natal ou na época da seca para alimentar os famintos. Porém o benefício não atinge todos e quando termina a campanha, acaba também o sustento. Por isso é fundamental que o faminto tenha condições de se sustentar, para que a fome seja definitivamente erradicada.
O aumento do salário mínimo também melhora a distribuição de renda, já que o patrão passa a pagar mais a seus empregados. Além disso, no mercado informal, os salários tendem a se ajustar no patamar do novo mínimo. Como a maior parte dos pobres trabalham informalmente, há um aumento generalizado do poder aquisitivo.
Para visualizarmos a importância do salário na vida do brasileiro: 2/3 da população, 111 milhões, dispõe de renda familiar de até 2 salários mínimos e destes 34 milhões com renda inferior a ½ mínimo. Por fim o dado mais agravante: 1% da população concentra fortuna equivalente ao rendimento de 50% mais pobres da população.
A pobreza e a fome são parte do processe cíclico da má distribuição de renda. Hoje no Brasil temos 60 milhões de pobres (outras fontes indicam “apenas” 30 milhões) e outros tantos milhões abaixo da linha de indigência. A definição de pobre é aquele que tem uma renda per capita familiar inferior a linha de pobreza. A linha de pobreza é o custo das necessidades básicas do indivíduo. Os indigentes não conseguem nem satisfazer suas necessidades alimentares – são os famintos. Na população rural, 40% das pessoas são pobres. Isso se deve a extrema concentração de terra, já abordada anteriormente. Para termos uma idéia da enorme discrepância entre latifundiários e pequenos proprietários bastam estes números. Dos 5 milhões de estabelecimentos rurais, a metade possui menos de 10 hectares, numa área de aproximadamente 7,9 milhões de hectares. Já os 37 maiores latifúndios possuem juntos 8,3 milhões de hectares.
Este é o alicerce da má distribuição de renda no Brasil, pois dos latifúndios são improdutivos e servem como bem de capital. Se estes fossem integrados à reforma agrária, haveria uma maior produção de gêneros alimentícios básicos, ao invés da monocultura de exportação. Esses gêneros, além de suprir a necessidade do assentado, integraria a economia local, reduzindo substancialmente a fome e a pobreza. Mas a reforma agrária no Brasil é quase que inexistente, pois as decisões do Congresso são encabeçadas pela “bancada da terra”, que é radicalmente contra qualquer mudança na estrutura fundiária brasileira, a não ser em seu próprio benefício.
O flagelo da fome ainda acarreta a uma série de problemas, como a baixa expectativa de vida, a elevada taxa de mortalidade infantil, o nanismo, que é a diminuição da estatura da população de uma região que enfrenta por várias gerações o problema da má alimentação e um sem número de doenças relacionadas à carência de nutrientes. Nesse cenário, epidemias e verminoses se espalham rapidamente.
Outro ponto fundamental é a educação pública: uma educação de baixa qualidade impede que o pobre integre-se ao mercado de trabalho e possa enriquecer ou até mesmo ter uma estabilidade. Já o rico, numa escola particular, mantêm-se em seu padrão de vida, geração por geração. Nesse ciclo vicioso, riqueza gera riqueza e pobreza gera pobreza. No urbano, aquele que não possui o ensino médio e atualmente uma especificação técnica ou experiência, compõe a imensa massa de desempregados. Estes incham as favelas das grandes cidades à procura de trabalho, vivendo precariamente na pobreza, muitos também passando fome.
Entende-se também por educação a informação. No Brasil, a mortalidade infantil é bem maior entre os mais pobres. Os pobres morrem de diarréia porque não conhecem o soro caseiro e que não amamentam mais que três meses (também devido ao estado de denutrição da mãe) pela falta de informação. A prova maior é a redução da mortalidade infantil após as propagandas sobre o soro caseiro e o acompanhamento médico nas comunidades carentes.
A realidade é que o Brasil tem uma dos piores índices de distribuição de renda no mundo, dezenas de milhões de pobres e outros milhões de famintos. Governos e mais governos passaram e a situação apenas piorou. Melhorar esse quadro não significa capítulos e mais capítulos de soluções demagógicas, mas sim poucas ações efetivas.
Dentre essas ações estão o aumento do salário mínimo, a diminuição do preço dos alimentos, diminuição da carga tributária dos mais pobres, através de uma reforma fiscal, melhora na educação e reforma agrária.
Porém nenhum destes projetos pode ser implementado sem a tal “vontade política”, pois os que estão no poder são os mesmos que são beneficiados pela deplorável estrutura social do Brasil. Além disso, reformas que revelariam suas conseqüências positivas apenas 15 ou 20 anos depois de implementadas não são um bom artifício de campanha eleitoral. Desse modo, a distribuição, a pobreza e a fome tendem apenas a se agravarem…
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